Artigo de Saúde Pública®
Nº 65 / Dezembro de 2007
00 III -
Glaucoma atinge 200 milhões em todo o Mundo
Já algumas pessoas ouviram falar, mas, provavelmente, não sabem que o glaucoma é uma doença que acompanha o doente para toda a vida e que, se não for controlado, pode cegar, sendo mesmo a segunda causa de cegueira nos países desenvolvidos.
O glaucoma é uma doença crónica, degenerativa, que afecta o nervo óptico, e com algumas especificidades que tornam o seu diagnóstico precoce muito complexo. É uma patologia que, nomeadamente a que afecta a maioria dos indivíduos – glaucoma primário de ângulo aberto – na fase inicial, não apresenta sintomas.
Existem outros subgrupos da doença, como os glaucomas agudos, que se manifestam com dores oculares, dores de cabeça, vómitos, entre outros, que podem levar o doente à urgência», começa por esclarecer o Dr. Carlos Aguiar, director do Serviço de Oftalmologia do Hospital Geral de Santo António, do Porto, e coordenador da Secção do Grupo Português de Glaucoma da Sociedade Portuguesa de Oftalmologia
Não se pense que se trata de uma doença rara, ou mesmo que afecta poucas pessoas. São mais de 200 milhões de doentes, a nível mundial, que sofrem de glaucoma. Em cada 30 pessoas, uma sofre desta doença, e Portugal não foge à regra.
Mas, na prática, como se caracteriza o glaucoma?
O especialista explica que, «dentro do nosso olho, está constantemente a ser formado, à média de dois microlitros por minuto, um líquido designado de humor aquoso, com a função de alimentar determinadas estruturas oculares. À medida que é formado, tem de ter vias de escoamento. Esse escoamento é feito principalmente através das chamadas vias trabeculares. Quando há um deficit de escoamento, a pressão dentro do olho vai aumentar. Essa pressão intra-o-cular aumentada é o principal factor de risco de glaucoma».
Contudo, é possível sofrer de glaucoma com tensões oculares dentro de valores considerados normais.
Assim, e de acordo com o oftalmologista, «o diagnóstico, bem como o seguimento destes doentes, implica, além do estudo estrutural do nervo óptico e das suas fibras nervosas através de analisadores computorizados, uma avaliação do seu funcionamento ou função através de exames perimétricos e campos visuais, entre outros».
Esta situação leva a efeitos extremamente prejudiciais para a saúde. As consequências desta pressão sustentadamente aumentada são «o danificar do nervo óptico, levando, em casos extremos, à cegueira. O controlo desta patologia é feito através da vigilância da pressão intra-ocular, nomeadamente com uma prescrição farmacológica.
Tem havido desenvolvimentos muito interessantes nesta área, o que nos dá mais opções de tratamento. Quando a terapêutica médica não resulta, recorre-se à cirurgia, que consiste na criação de uma via alternativa de escoamento às vias trabeculares, um bypass. É doença insidiosa que deve ser diagnosticada pelo médico e não através das queixas do doente», alerta Carlos Aguiar.
Numa fase já adiantada da patologia, com perdas do tecido do nervo óptico já na casa dos 60 ou 70%, já pouco há a fazer.
De acordo com o médico, «como todo o tecido pertencente ao sistema neuronal, não se replica. Nascemos com uma determinada quantidade e temos de fazer a sua gestão ao longo das nossas vidas».
Factores de risco
Apesar de ser uma doença grave, pode e deve ser devidamente controlada, principalmente se forem respeitadas as recomendações relativas aos factores propensos à doença.
«Há três factores maiores predisponentes para esta doença. Temos de estar atentos à história familiar. Este factor condiciona a possibilidade de um indivíduo sofrer desta patologia. Outro aspecto está relacionado com a questão racial. Sabemos que os sujeitos pertencentes à raça negra têm uma possibilidade acrescida de padecer da doença, e com uma evolução mais grave. Finalmente, a idade. É uma patologia mais frequente a partir dos 40 a 50 anos, sendo que a sua prevalência e frequência vai subindo nos pacientes de faixas etárias mais elevadas», alerta Carlos Aguiar.
É uma doença que causa problemas em duas vertentes. Se o paciente se queixa, pode já ser tarde demais. Se é diagnosticado a tempo, nem sempre a terapêutica é cumprida por parte dos doentes.
Segundo o coordenador da Secção do Grupo Português de Glaucoma, «há dois motivos que contribuem para a gravidade desta doença: se for diagnosticada tardiamente e quando muitos doentes sem sintomatologia, mas já identificados, não cumprem como devem a terapêutica. A necessidade do cumprimento rigoroso da medicação tem de ser muito bem explicada. Colocar, de forma crónica, gotas nos olhos, quando um paciente não sente que tem algo de errado, causa muitos transtornos, o que o leva a não cumprir a prescrição»
Além disso, a grande maioria destes doen-tes já apresenta uma idade avançada. Isso faz com que possam «necessitar de apoio de outra pessoa para instilar as gotas nos olhos. Também acontece esquecerem-se de as pôr. Toda esta realidade faz com que o glaucoma seja a segunda causa de cegueira bilateral, ou seja, nos dois olhos, nos países desenvolvidos».
Assim, atendendo às questões inerentes a esta doença, o médico afiança que, como recomendação, «primeiro, o indivíduo deve ter consciência da história familiar. Depois, quando começa a ter algumas dificuldades normais de visão, que tendencialmente aparecem a partir dos 40 a 50 anos, deve fazer um exame num oftalmologista e não nas ópticas.
Esta atitude é muito importante para obter um diagnóstico
precoce. Apanhar um paciente com 10% do nervo ocular danificado é completamente diferente de o apanhar com 60 ou 70%», termina.
Texto: Rui Miguel Falé