Por feridas podemos entender múltiplas situações, que vão desde as pequenas escoriações a cortes e/ou pequenas queimaduras, ou a situações graves. Mas as feridas que preocupam maior número de profissionais são designadas por úlceras de perna e úlceras de pressão e necessitam de abordagem adequada.
As feridas resultantes de um pequeno acidente, de uma escoriação, corte ou queimadura são pequenos incidentes que se tratam por si só e a que não é dada grande importância. Mas existe um outro tipo de feridas que têm uma grande incidência na população e que passam quase despercebidas para quem é alheio ao problema.
«São as feridas dos indivíduos acamados com diferentes deficits e/ou associadas a patologias crónicas. Estas feridas, nomeadamente as úlceras de pressão, apresentam-se, frequentemente, em pessoas em situação de dependência e que se encontram em hospitais, lares e/ou no domicílio. As doenças de origem vascular acometem grande percentagem da população mas, no que se refere à população mais jovem e em idade activa, há uma preocupação grande com as úlceras de perna (um outro tipo de ferida), que são um mal preocupante no nosso país», esclarece a Enf.ª Rita Videira, da Unidade de Cuidados Intermédios do Hospital de São João e membro da Direcção da Associação Portuguesa de Tratamento de Feridas (APTFeridas).
Em Portugal, as úlceras de perna são, de facto, um problema grave, comprometendo a qualidade de vida global e consequente produtividade a nível laboral, com as compreensíveis repercussões sociais e económicas.
Além disso, por norma, as pessoas com úlceras de perna não identificam a dimensão do problema que envolve esta situação e dirigem-se aos centros de saúde para a sua resolução.
Enf.ª Rita Vieira
«Andam anos e anos a ser tratadas e a cura prolonga-se no tempo por múltiplos factores, mas também porque nos centros de saúde não está ainda generalizada a formação específica, para uma abordagem eficaz a estas feridas, ou seja, para fazer um diagnóstico adequado e um tratamento preciso», esclarece Rita Videira.
Úlceras de perna e úlceras de pressão
De acordo com o Dr. José Neves, cirurgião geral e vascular e coordenador da Consulta Multidisciplinar de Úlcera de Perna do Hospital dos Capuchos, «as úlceras de perna são feridas que se localizam abaixo do joelho e, normalmente, não cicatrizam num espaço de duas ou três semanas. A principal causa da úlcera de perna é a doença venosa.
Actualmente, representa cerca de 70 a 80% dos casos. Nas úlceras de perna, o sangue não circula da maneira que devia, originando-se um aumento da pressão do sangue dentro das veias, o que provoca a fuga de certas substâncias para os tecidos circundantes. Perante esta situação, o processo de irrigação não é feito da melhor forma e alguns tecidos morrem».
No entanto, importa acrescentar que, para além da doença venosa, existem muitas outras causas que podem levar ao aparecimento das úlceras de perna. «Muitos doentes sofrem desta patologia porque têm problemas que estão relacionados com a circulação arterial, diabetes, traumatismos, tumores, entre outros», informa José Neves.
Dr. José Neves
Actualmente, não existem dados concretos sobre o número de pessoas que sofrem de úlcera de perna. No entanto, perante os dados de outros países, «podemos partir do princípio que a prevalência da úlcera de perna na população adulta portuguesa é de 1%, mas, se falarmos de pessoas com 70 anos ou mais, a incidência ronda os 10%. Trata-se de uma situação extremamente pesada em termos económicos e sociais. Estima-se que nos países europeus o gasto com o tratamento das úlceras de perna é de cerca de 2% do orçamento para o Serviço Nacional de Saúde (SNS)».
Para além das úlceras de perna também existem as úlceras de pressão. Segundo José Neves, «as úlceras de pressão ocorrem porque existe um aumento da pressão de forma prolongada sobre uma determinada região que, normalmente, são as proeminências ósseas. Habitualmente, nas úlceras de pressão existe irrigação deficiente dos tecidos, o que faz com que muitos acamados acabem por desenvolver feridas que, para além de outros factores, podem também surgir devido ao facto de estarem sempre na mesma posição. Normalmente, esta situação ocorre com mais frequência em pessoas de idade avançada e desnutridas».
No caso das úlceras de pressão, «os doentes devem ter cuidados muito específicos. Hoje em dia, nos hospitais, esta situação já é levada em consideração. Tentamos despertar consciências para a mobilização frequente dos doentes e para a monitorização do estado nutricional, que deve ser adequado a cada doente, conforme as suas necessidades».
Para além da mobilização, os profissionais também devem ter o cuidado de lhes massajar a pele para que a circulação possa ser activada e, não menos importante, programar uma adequada estabilização das patologias associadas.
Formar na área das feridas - APTFeridas
A Associação Portuguesa de Tratamento de Feridas (APTFeridas) nasceu, em grande parte, com o objectivo de formar os profissionais de saúde na área do diagnóstico e tratamento de feridas.
«Há dez anos, em Portugal, não havia conhecimentos e linhas de orientação adequadas para o tratamento de feridas. Ainda existem lacunas importantes, mas através do trabalho da APTFeridas temos procurado dar resposta à carência destes conhecimentos específicos. Actualmente, temos grande número de pedidos de formação, principalmente, por parte das áreas da saúde onde predominam profissionais de enfermagem, mas onde também aparecem profissionais médicos e farmacêuticos carentes deste tipo de informação/formação, nomeadamente a nível das ARS. Também as escolas de enfermagem nos «exigem» presença assídua anual», refere a Enf.ª Rita Videira, membro da Direcção da APTFeridas.
Porém, existe ainda o grande problema da aplicação nos serviços dos conhecimentos adquiridos nestas formações.
«Muitas vezes não há condições ou não se criam as condições nas instituições para a implementação na prática deste ensino/aprendizagem. Não podemos dizer que não existe formação porque já existe, mas a implementação no terreno continua a falhar e a ser problemática. Digo muitas vezes que a informação é poder, mas não vale nada se não for transmitida aos outros para ser aplicada e promover a melhoria dos cuidados à população. É importante que a aprendizagem seja aplicada nos locais de trabalho.»
O Congresso anual da APTFeridas decorreu de 7 a 9 de Novembro de 2007, no Fórum da Maia, e contou com a presença de pessoas que transmitiram as suas experiências e que efectuaram mudanças nos próprios serviços.
A ideia do Congresso foi e é, anualmente, trazer também novidades na área, contando inclusive com profissionais internacionalmente creditados.
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Texto: Teresa Pires/Paula Pereira