Artigo de Saúde Pública®
Nº 54 / Dezembro de 2006
03 Conviver com o cancro da próstata
O carcinoma da próstata é uma doença que evolui sem sintomas, o que pode conduzir a uma detecção tardia, reduzindo as possibilidades de cura. O diagnóstico precoce é a melhor arma para fazer frente ao segundo cancro mais mortal no sexo masculino.
Diagnóstico regular após os 50 anos pode ser «salvação»
As causas do cancro da próstata ainda não estão identificadas, muito embora se reconheça a existência de factores que podem influenciar negativamente o aparecimento deste cancro. O aumento da idade, os indivíduos de raça negra e a história de familiares de primeiro grau com cancro da próstata são elementos que podem elevar o risco de contrair a doença.
«A incidência deste carcinoma aumenta com a idade, ou seja, não é decididamente uma doença do homem jovem. Contudo, tem-se assistido ao aparecimento desta neoplasia em idades cada vez mais precoces», defende o Dr. Carlos Rabaça, urologista do IPO de Coimbra, que adianta:
«A maioria das normas de orientação clínica aconselham um rastreio anual a partir dos 45, ou 50 anos, em caso de risco elevado. No entanto, dado o crescente número de casos diagnosticados abaixo desta faixa etária, os urologistas recomendam uma consulta regular desde os 40 anos.»
O cancro da próstata progride sem qualquer sinal ou sintoma, manifestando-se apenas numa fase já avançada, em que as possibilidades de cura são reduzidas. Segundo o urologista, «80% dos casos são diagnosticados por exames médicos de rotina, em indivíduos que não revelam quaisquer queixas».
O diagnóstico, numa fase inicial, é dificultado pela ausência de sintomas, daí a necessidade de se alertar para a realização de exames regulares. A detecção precoce permite travar o processo de evolução do cancro, através de «tratamentos com elevadas taxas de cura, numa fase de doença localizada, ou seja, quando o tumor ainda não se disseminou a outras áreas do organismo».
A prova dos nove
Em caso de suspeita, o procedimento mais correcto é sempre recorrer ao urologista. A realização de consultas e exames de rotina pode evitar que o problema alastre e tome proporções não desejadas. Alguns exames e testes urológicos, como o toque rectal, o doseamento sérico do PSA (antigénio específico da próstata) e a ecografia prostática transrectal, são a melhor forma de «tirar a limpo» qualquer desconfiança.
«O toque rectal é um exame muito fácil e simples, que consiste na palpação prostática digital (com o dedo), por via anal, fornecendo informações importantes acerca do volume, consistência e limites prostáticos», diz o especialista, que completa:
«O PSA é uma substância produzida pela próstata normal, mas cujos valores sanguíneos se elevam quando há doenças prostáticas, particularmente nos casos de carcinoma.»
Carlos Rabaça salienta, no entanto, que uma elevação dos níveis de PSA «não significa, necessariamente, a existência de um cancro da próstata». A elevação do PSA, conforme explica, «ocorre, em média, cinco anos antes da detecção de qualquer anomalia ao toque rectal».
A ecografia prostática transrectal é outro dos instrumentos de diagnóstico, que «oferece informações importantes, como a existência de nódulos prostáticos ou compromisso dos limites da glândula».
Para que não restem dúvidas, em caso de suspeita, a confirmação do diagnóstico é feita através da biopsia prostática. «Trata-se de uma técnica que consiste na colheita de vários fragmentos de próstata, por via ecoguiada e transrectal. A biopsia é um exame simples e bastante bem tolerado pelo doente, que se faz em ambulatório, sem necessidade de qualquer internamento.»
«Novos caminhos no tratamento de doentes»
O curso das doenças nem sempre é simples de travar, principalmente quando se fala de cancro. No entanto, se o tumor estiver circunscrito à próstata, é possível «oferecer ao doente uma terapêutica com intuito curativo».
A este propósito, o urologista destaca três tratamentos para o cancro da próstata: prostatectomia radical, radioterapia externa e braquiterapia. A prostatectomia radical, que consiste na remoção cirúrgica da próstata e vesículas seminais, é, de acordo o especialista, «o método mais eficaz, mas com alguns efeitos secundários, como a disfunção eréctil (em 50-90% dos doentes) e incontinência urinária de esforço, habitualmente transitória».
Como alternativa à cirurgia, existe a radioterapia externa ou a braquiterapia, que consiste na introdução de sementes radioactivas na próstata, sob efeito de anestesia. «Estes dois métodos representam um menor compromisso da função sexual, sem repercussão na continência urinária, mas com taxas de cura inferiores à cirurgia e com alguns efeitos secundários não negligenciáveis.»
As metástases – propagação do tumor para outras zonas do corpo – representam um desafio terapêutico, devido à incapacidade de oferecer a cura como tratamento. Ainda assim, «existem alternativas de tratamento, que permitem ao doente com cancro da próstata olhar para o futuro com esperança», mesmo nas fases mais avançadas da doença:
«A terapêutica hormonal, embora não curativa, pode conduzir à remissão de longa duração, permitindo uma excelente qualidade de vida ao doente. Por outro lado, com o tempo, o tumor pode evoluir para um estado que se designa de cancro da próstata hormonorresistente, em que 70% dos doentes apresentam metastização óssea», explica o especialista.
A recente investigação nesta área tem-se aliado a alguns progressos: «Nos últimos anos, surgiram terapêuticas importantes, desenhando novos caminhos no tratamento de doentes hormonorresistentes e metastizados.»
Reduzir a dor e aumentar a sobrevida do doente metastizado
«Para além da melhoria substancial da terapêutica da dor – através do uso de analgésicos –, está disponível uma nova droga com resultados comprovados. Trata-se do ácido zoledrónico, da classe dos bifosfonatos, que ajuda a reconstruir e a fortificar o osso», salienta o urologista, ressalvando:
«Este fármaco demonstrou ser eficaz na redução da dor óssea, provocada pelas metástases, sendo responsável por uma diminuição e um atraso no aparecimento das complicações ósseas, como fracturas, ou necessidade de radioterapia paliativa. Estão em curso estudos que apontam a possibilidade de utilização do ácido zoledrónico em estádios mais precoces, como forma de evitar o aparecimento de metástases ósseas em doentes de risco.»
O especialista refere, ainda, a existência de uma outra terapêutica aprovada recentemente para o tratamento de doentes hormonorresistentes. «O docetaxel é um tipo de quimioterapia que demonstrou aumentar a sobrevivência de doentes com cancro da próstata, melhorando, também, a sua qualidade de vida.»
Texto: Andreia Pereira