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Artigo de Saúde Pública®

Nº 38 / Outubro de 2005






06 Doente oncológico: Ganhar qualidade de vida é sinónimo de viver
O diagnóstico de doença oncológica, para a maioria das pessoas, é igual a «sofrimento» e «morte». Estes são os termos mais relacionados com o cancro. Na opinião do Prof. Francisco Luís Pimentel esta correlação não é verdadeira. A mensagem de esperança que se deve transmitir ao doente oncológico é de que a equipa assistencial pode não lhe oferecer a cura, mas é capaz de tentar controlar a doença e, assim, trazer-lhe qualidade à vida.

Teresa Pires

Tratar um cancro é muito diferente de tratar uma infecção. Na infecção há um agente adquirido no exterior que nos permite utilizar armas para o matar directamente sem perturbar muito o corpo. Na doença oncológica o processo é diferente.

«Temos de tentar matar algo que cresceu a partir do próprio corpo do doente. As armas que vou utilizar, sejam elas quais forem dentro da Oncologia, vão destruir o tumor mas também células normais», explica o Prof. Francisco Luís Pimentel, director do Serviço de Oncologia do Hospital de São Sebastião, em Santa Maria da Feira.

Assim, o papel do médico é servir de balança, isto é, avaliar se a destruição do tumor é maior do que as agressões provocadas no corpo. Enquanto a balança se inclinar deste modo é legítimo que os tratamentos sejam aplicados. A partir do momento em que se inverte a situação, é necessário parar com a terapêutica e, no caso de não existirem outras alternativas, o médico opta pelo suporte sintomático.

«A própria quimioterapia pode ser de suporte sintomático, ou seja, o objectivo pode não ser a cura. Quando a quimioterapia deixa de ser eficaz privilegiamos terapêuticas de suporte que não sejam tão agressivas para o organismo, como o tratamento da dor, da dispneia, das náuseas e dos vómitos.»

Isto é, o objectivo principal deixa de ser prolongar o tempo de vida do doente, e passa a ser proporcionar-lhe uma melhoria na sua qualidade. Aqui cria-se uma espécie de conflito, na medida em que prolongar a vida e ter qualidade podem não ser compatíveis, e só uma correcta avaliação da qualidade de vida permite definir uma estratégia terapêutica que proporcione benefício ao doente.

«Por exemplo, no cancro do pulmão de não pequenas células, até alguns anos atrás era muito raro fazer-se quimioterapia. Acreditava--se que não iria ter efeitos sobre o aumento de sobrevivência do doente e apenas iria produzir queda de cabelo, náuseas e vómitos, para além da probabilidade de infecções. Contudo, foi possível demonstrar de uma forma científica, medindo a qualidade de vida de doentes, que se fizermos quimioterapia não aumentamos a sua sobrevivência significativamente, mas aumentamos muito a sua qualidade de vida», afirma Francisco Luís Pimentel.

Esta realidade é difícil de transmitir à população em geral, uma vez que há a noção de que a quimioterapia afecta sempre negativamente o bem-estar do doente.

Sobre a sua experiência, o director do Serviço de Oncologia refere que, «hoje em dia, quando trato um doente de neoplasia do pulmão avançada, posso aumentar alguns meses a sua sobrevivência, mas, essencialmente, o que consigo através da quimioterapia é dar ao doente uma qualidade de vida mais elevada nos meses que lhe restam, tendo apenas uma queda abrupta nas últimas duas a três semanas de vida. Se não fizermos nada por esse doente, esta degradação é constante e o somatório de qualidade e tempo de vida é muito menor».

Aliviar os efeitos da terapêutica

A qualidade de vida no doente oncológico é um factor primordial. Nos cancros designados por tumores líquidos, como as leucemias e os linfomas, a possibilidade de cura é muito alta. Nestes casos específicos pisa-se o risco até muito perto da morte em termos de tratamento com quimioterapias agressivas. Este risco vale a pena na medida em que existe uma grande probabilidade de o doente viver muitos e bons anos, ou mesmo de ficar curado.

«É legítimo condicionar a qualidade de vida, que pode ser muito má durante alguns meses, com terapias bastante agressivas, para tentar obter a cura», salienta Francisco Luís Pimentel, acrescentando: «Costumo dizer que a quimioterapia não é uma fórmula, mas um fato que desenhamos e aplicamos ao doente e, como tal, temos de o medir nas diversas vertentes, adaptando-o a cada caso.»
Os avanços na Oncologia são cada vez maiores e houve inclusive uma explosão de novos fármacos. Actualmente, as armas de quimioterapia têm registado um aumento quantitativo e qualitativo.
A título de exemplo, e pela primeira vez em termos históricos na aprovação de um fármaco, a FDA – Food and Drug Administration – autorizou um citotóxico para o tratamento do cancro do pâncreas que não traz ganhos significativos em termos de sobrevivência, mas que melhora a qualidade de vida do doente.

«Suprimir todo o sofrimento é uma ilusão, mas, por partes, consegue-se minimizá-lo. Controlar a dor e as náuseas do paciente é sentido, por parte do médico, como uma pequena batalha que foi ganha. O tempo de vida que resta ao doente pode não ser muito, mas o importante é que esse doente durante esse período se possa sentir bem, com o mínimo de sofrimento», sublinha o especialista e adianta:

«Os efeitos secundários da quimioterapia, nomeadamente as náuseas e os vómitos já não representam, hoje em dia, um grande problema para o doente, devido à acção de fármacos como os antieméticos. Temos agora um novo fármaco antiemético (aprepitant) que vai colmatar uma faixa de doentes que não respondem a outros antieméticos. Este fármaco não vai resolver todos os problemas, mas contribui para nos libertar da preocupação de mais um sintoma.»

Com este cenário de avanços científicos, a quimioterapia já não é tão difícil de ser suportada porque se pode proteger os doentes dos seus efeitos adversos. De acordo com Francisco Luís Pimentel, «é neste sentido, de dar qualidade ao doente, que se deve caminhar, embora não seja uma ideia bem aceite entre os políticos e os gestores da saúde porque não conseguem compreender como se gasta dinheiro com um fármaco quando não se destrói o tumor nem se aumenta o tempo de vida».

O estigma social do cancro

O doente oncológico fica condicionado pelo estigma social e pela posição que tem em relação à vida. A sociedade portuguesa é caracterizada por uma profunda negação da morte, incluindo os próprios profissionais de saúde.

Porém, «temos cada vez mais um número significativo de neoplasias – tumores – que conseguimos curar e, por outro lado, há também neoplasias em que somos capazes de fazer com que o doente tenha uma sobrevivência longa, tornando o seu problema oncológico numa doença crónica. O doente não fica curado, mas vai viver vários anos com essa patologia, podendo vir a falecer de qualquer outro problema que não seja do tumor», refere Francisco Luís Pimentel.

Por outro lado, e também em consequência das questões culturais, o diagnóstico da doença oncológica é por vezes ocultado ao próprio doente, no entanto, essa informação é um factor que predispõe para uma menor qualidade de vida.

Em alguns trabalhos que o médico levou a cabo, a maioria dos doentes querem saber se têm ou não um cancro. «O grupo de doentes que sabia da sua doença apresentava uma melhor qualidade de vida, em comparação com o grupo dos que não sabiam. Outra conclusão é a de que a maior parte dos doentes quer ter conhecimento da patologia, mas os familiares não querem que o próprio saiba», afirma.

Aos doentes que têm consciência do seu problema, assim como aos respectivos familiares, proporciona-se um ambiente de apoio, de interacção, capaz de aumentar a qualidade de vida.

«Há dias em que não me lembro que tenho cancro»

Há quase quatro anos foi-lhe diagnosticado cancro do pulmão. Na altura, Leonor (nome fictício) ficou em estado de choque, mas, por fim, aceitou. Faz parte da sua maneira de ser – é optimista e vai à luta.

Tudo começou pelo cansaço. «Sempre caminhei muito e apercebi-me que cada vez ficava mais cansada. Costumava dizer que já me levantava cansada da cama. Nunca desconfiei que podia ter um tumor no pulmão, até porque não sou fumadora», salienta Leonor.

Fez vários tratamentos, entre quimioterapia e radioterapia. O cabelo caía, crescía e voltava a caír. Mais tarde desenvolveu líquido no pulmão e era necessário proceder à toracocentese, ou seja, à retirada do líquido que fica na cavidade pleural (entre o pulmão e a parede torácica), através de uma agulha.

O processo «era muito doloroso. Sentia dores desde o ombro até ao peito e só me conseguiam tirar um litro de líquido porque, depois, as dores tornavam-se insuportáveis.

Fazia este tratamento de três em três meses até que se tornou semanal», conta Leonor.
Posteriormente, começou a ser tratada pelo Prof. Francisco Luís Pimentel, que lhe indicou como alternativa a quimioterapia paliativa, com a finalidade de aumentar a sobrevida e/ou permitir uma melhor qualidade de vida através do controlo dos sintomas, quando a cura não é possível.

Faz cinco meses que segue este tratamento e o resultado tem sido bastante positivo. «Deixei de sentir o cansaço e tenho tido uma qualidade de vida muito boa. Se não me dói nada, faço de conta que não tenho nada. Há dias em que não me lembro que tenho cancro. As dores também desapareceram e quando sinto enjoos tomo um comprimido e fico melhor. Quando faço quimioterapia, à noite tomo também um desses comprimidos. Estou bem e ninguém diz o problema que tenho», conclui Leonor.
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