- Dr. João Morais
A trombose é um problema de saúde muito vasto e não está apenas associado a acidentes vasculares cerebrais (AVC), como é habitual pensar-se. A temática esteve em destaque num encontro europeu sobre trombose, promovido pela Sociedade Europeia de Cardiologia e que se realizou, pela primeira vez, em Portugal.
A tendência é associar a trombose ao acidente vascular cerebral (AVC), mas, na realidade, este problema grave de saúde não é apenas causa dos AVC, mas sim de várias situações, algumas das quais de grande gravidade.
«É preciso desmistificar esta ideia: o enfarte agudo do miocárdio (EAM) e a flebotrombose (coágulo de sangue numa veia) também são provocados por fenómenos trombóticos, ou seja, forma-se um trombo (coágulo) numa artéria ou veia e o sangue é interrompido em determinado território», explica o Dr. João Morais, director do Serviço de Cardiologia do Centro Hospitalar Leiria/Pombal.
Apesar das consequências graves da trombose, esta é potencialmente evitada se se tiver um estilo de vida saudável, optando-se por uma alimentação regrada e por uma vida menos sedentária, sem nunca esquecer a obrigação de deixar de fumar.
«Nunca é demais falar da importância de se comer mais peixe que carne, controlar as bebidas alcoólicas, consumir fruta e produtos hortícolas, não fumar, praticar exercício físico e, na pior das hipóteses, nem que seja simplesmente caminhar. Estas mudanças previnem o surgimento destes acidentes cardiovasculares, que poderão pôr em causa a nossa qualidade de vida ou até levar-nos à morte», salienta o especialista.
Os acidentes trombóticos mais comuns
A trombose costuma estar associada à arteriosclerose, uma doença que leva ao envelhecimento das artérias, tornando-as mais finas, rígidas e com tendência a obstruir.
Esta patologia pode afectar qualquer vaso sanguíneo, sendo os mais frequentes a artéria aorta (principal vaso do corpo humano), as artérias coronárias (que irrigam o coração), as artérias cerebrais (que irrigam o cérebro) e as artérias periféricas (que irrigam braços e pernas).
«Trata-se de uma doença que pode ser bastante grave, mas que é prevenível, adoptando-se os tais hábitos saudáveis. É raro ocorrer um acidente trombótico quando as artérias são saudáveis». Neste caso, «o controlo dos níveis elevados de colesterol é essencial, já que os seus níveis elevados favorecem a deposição de gordura nos vasos». A hipertensão e a diabetes são outros factores de risco a ter em atenção. Quanto mais rigoroso é o controlo menos provável é o acidente.
Os acidentes trombóticos arteriais mais comuns são o AVC e o EAM. O conhecimento dos sintomas é «muito importante, já que as duas primeiras horas são cruciais para se conseguir evitar a morte e as sequelas mais graves». «O AVC e o EAM, na maioria das vezes, não são fulminantes. Muitas vezes surgem apenas alguns sintomas, que devem ser vistos como um alerta. No caso do AVC, a boca pode ficar ao lado, a voz desarticulada e pode-se acompanhar de uma perda de força muscular localizada a uma metade do corpo. No EAM ocorre habitualmente uma dor muito forte no centro do peito, por vezes, acompanhada de sudação intensa e vontade de vomitar. A dor chega a ser tão intensa que o doente sente dificuldades em respirar.»
Logo que se detecte qualquer um destes sintomas, a pessoa deverá ligar o 112. «Nunca se deve achar que vai passar. Há muitos doentes que não conseguem recuperar porque esperaram tempo demais para pedir ajuda.» O responsável salienta que «a mortalidade baixa bastante se houver
uma intervenção médica precoce».
Uma outra situação habitualmente menos grave, mas que não deve ser esquecida, é a trombose que ocorre nas veias. As mulheres são as mais afectadas com os coágulos que se formam nas pernas, devido à má circulação e às varizes. «As veias dilatam-se e o fluxo de sangue torna-se mais lento, fenómenos estes que surgem principalmente depois da gravidez e que se acentuam ao longo dos anos. Nestes casos, pode haver um trombo que se aloja numa veia, que pode interromper a circulação sanguínea, que pode originar uma embolia pulmonar, esta sim uma complicação temida pelas graves consequências que pode acarretar», explica João Morais.
É possível prevenir a trombose
João Morais considera que Portugal tem «óptimos serviços de Cardiologia, tendo ao dispor todos os equipamentos necessários e os melhores profissionais de saúde». Mas as pessoas também precisam de pôr em prática o que aprendem nas várias campanhas de educação para a saúde.
«A abolição do tabagismo, a prática de uma alimentação saudável e o exercício físico são mesmo importantes e podem, de facto, evitar complicações trombóticas ou, no caso destas ocorrerem, há menos probabilidades de se morrer ou de se ficar com sequelas graves.»
Para este especialista, é importante continuar a apostar na educação, dando a conhecer também as várias manifestações da trombose. «Os hábitos saudáveis devem começar na infância. É mais fácil transmitir a mensagem ao meu filho de cinco anos do que ao meu pai de 85.»
Além disso, trata-se de «um problema de todos». «Por exemplo, até posso educar o meu filho a ter hábitos de vida saudável em casa, mas esse trabalho acaba por não dar grandes frutos se na escola é fácil ter acesso a alimentos que não são benéficos para a saúde.»
Cada pessoa tem, assim, nas suas mãos, a possibilidade de reduzir a probabilidade de vir a ter um episódio, já que
não acontece só aos outros.
Encontro europeu destaca acidentes trombóticos
O tema da trombose esteve em destaque no Eurothrombosis Summit 2011, que decorreu em Outubro, no Porto, cuja presidência esteve a cargo do Dr. João Morais.
Foi a primeira vez que este evento europeu teve lugar no nosso País. E foi um sucesso, tendo contado com mais de 400 inscrições – metade das quais de especialistas de outros países –, para além dos 40 peritos nesta área que partilharam as suas experiências.
Texto: Maria João Garcia