Artigo de Medicina e Saúde®
Nº 98 / Dezembro de 2005
34 Especial – José Vaz de Carvalho, 76 anos, vítima de enfarte
Dar mais valor à vida
Antes e depois do enfarte do miocárdio, José Carvalho, doente cardiovascular, faz o balanço do que era e do que passou a ser a sua vida. A prática de exercício físico e os cuidados com a alimentação são o segredo para manter a juventude aos 76 anos, com as limitações de um coração debilitado.
Habituado a uma vida de trabalho duro e tarefas pesadas, José Carvalho nunca se privou do que sempre lhe deu mais prazer. Durante vários anos fumou, bebeu e nunca teve qualquer preocupação com a alimentação.
Aos 76 anos, e reformado do antigo Matadouro Municipal de Lisboa, a sua vida é bem diferente. O que a fez mudar? Um enfarte do miocárdio.
«Muito antes de sofrer o enfarte já tinha deixado de fumar. No entanto, continuava a cometer alguns excessos, nomeadamente, no que diz respeito a hábitos alimentares e ao consumo de bebidas alcoólicas», recorda, consciente de que, provavelmente, foram esses excessos que estiveram na origem do acidente cardiovascular.
Até esse dia nunca suspeitou sequer que podia ter problemas de coração, mas, de um momento para o outro, a sua realidade mudou para sempre. José Carvalho tinha se deslocado de Lisboa a uma aldeia próxima de Coimbra, terra onde nasceu, para ajudar um sobrinho numa actividade que sempre foi uma tradição familiar: as vindimas.
«Foi em Maio, há dez anos. No dia em que sofri o enfarte, lembro-me que estava a preparar-me para almoçar com a família. Não sei se fiz algum esforço, se não, só sei que senti uma dor muito forte nas costas e, depois, um aperto no peito. Do resto já não me recordo», conta José Carvalho. Desmaiou e foi levado de urgência para os Hospitais da Universidade de Coimbra, onde permaneceu durante nove dias.
«Fiquei em observação, até estabilizar, e depois fiz uma série de exames. Ao fim desses dias mandaram-me para casa», continua.
De regresso a casa, numa localidade perto de Loures, tomou, por certo, consciência de que a sua vida nunca mais seria a mesma.
«Vinha com indicações de uma dieta rígida porque tinha que perder algum peso. Receitaram-me uma alimentação à base de cozidos, grelhados, fruta, salada e muita água. Bebidas alcoólicas, nem pensar», diz José Carvalho. Para além de todas estas alterações nos seus hábitos alimentares, passou também a fazer longas caminhadas pelo fresco da manhã.
Umas vezes a um ritmo mais lento, outras com menos vagar, lá vai andando com algumas paragens pelo caminho, mais não seja para cumprimentar quem com ele se cruza na rua.
Do enfarte à cirurgia
Embora tenha estabilizado o seu estado de saúde, José Carvalho não mais voltou a confiar no seu coração. Os exames de rotina passaram a entrar no calendário e o cuidado com os excessos a fazer parte do seu dia-a-dia.
Algum tempo depois, começou a ter sintomas suspeitos de mais uma crise, e foi então que se preparou para a cirurgia.
«Primeiro comecei a sentir uma fraqueza, depois muito cansaço nas tarefas que anteriormente conseguia fazer sem grande esforço, até que o meu cardiologista me mandou fazer todos os exames necessários para a cirurgia».
A obstrução das artérias coronárias, causada por elevados níveis de colesterol no sangue, comprometeu o normal funcionamento do coração, o que exigiu a colocação de um bypass.
Foi, então, retirada uma veia da perna e utilizada para fazer a ligação da aorta até à zona da coronária, anterior à obstrução, de forma a facilitar a passagem do sangue.
Como uma espécie de ponte, a nova veia passou a irrigar o músculo do coração.
A recuperação foi lenta, mas com sucesso. Ao fim de alguns meses, José Carvalho garante que «estava como novo».
Poupar as veias novas e as velhas
Seis anos já passaram sobre a cirurgia, no entanto, há a possibilidade de uma nova obstrução, seja nas novas veias que foram colocadas, ou nas que sempre lá estiveram e que nunca precisaram de conserto. Consciente deste risco, José Carvalho mantém os hábitos que o médico lhe aconselha.
Continua a caminhar, evitando as horas de calor, continua a alimentar-se de acordo com a dieta que lhe foi imposta, e a não cometer os excessos de outrora.
«Este Verão apanhei mais um susto e pensei que desta seria de vez», conta, acrescentando:
«Comecei a desmaiar nas situações mais inesperadas, sem qualquer causa aparente. Não fazia nenhum esforço, não me enervava, mas caía para o lado sem forças. Só acordava passados alguns minutos, sem me lembrar exactamente do que tinha acontecido.»
Procurou de imediato o médico, e o problema foi solucionado com a devida urgência. O coração de José Carvalho começou a falhar e, por isso, tinha frequentes quebras de tensão. Para bater precisa hoje de uma ajuda extra, a de um pace-maker, ou «uma pilha», como lhe costuma chamar.
Olhando para trás, José Carvalho sabe que os dez anos que passaram sobre o enfarte foram suficientes para ver crescer a sua família. Os dois bisnetos, que desde então nasceram, são a prova de que todo o esforço foi compensado.
«Passei a dar mais valor a cada dia que passa e às pessoas que tenho à minha volta», garante.
Cátia Jorge/Saúde Pública®