Artigo de Medicina e Saúde®
Nº 91 / Maio de 2005
34 Hipertensão pulmonar – Quando os pulmões esperam ar.
«O doente deverá procurar o médico de família que, posteriormente, deverá encaminhá-lo para um pneumologista», aconselha o Dr. Carvalheira Santos
Pulmões à espera de ar
Se os lábios ganharam uma cor azulada, se anda cansado e com uma tosse persistente, o melhor é procurar um médico.
O diagnóstico de hipertensão pulmonar é grave e só identificado a tempo pode adiar a morte.
Maria João Saraiva começou a sentir que não conseguia subir escadas como nos outros tempos. O facto de ser «gordinha» poderia explicar a fadiga súbita, contudo, a tosse persistente e os desmaios repetidos não se encaixavam no diagnóstico.
Só depois de uma viagem ao estrangeiro é que sentiu necessidade de fazer alguns exames complementares. Inesperadamente, foi detectada uma mancha no pulmão e uma artéria dilatada.
«Felizmente, o meu problema foi detectado a tempo, o que tornou possível que os tratamentos impedissem a progressão dos sintomas», conta a professora da Mealhada.
Mas nem sempre é assim, o que acaba por explicar o porquê de muitos doentes viverem dependentes de uma bomba de oxigénio e, nos casos mais graves, que não tivessem resistido à pressão de ar nos pulmões.
Como explica o Dr. Carvalheira Santos, pneumologista do Hospital de Pulido Valente, SA, em Lisboa, a hipertensão pulmonar consiste num aumento da pressão com que o sangue circula na artéria pulmonar até chegar aos pulmões.
«Temos duas grandes artérias: a aorta, que leva o sangue do coração para todo o corpo, e a pulmonar, que encaminha o sangue do coração para os pulmões para poder ser purificado. A hipertensão pulmonar não é mais do que uma manifestação da dificuldade que existe para que o sangue chegue aos pulmões e seja oxigenado», elucida o pneumologista.
Atenção aos sinais
Se o sangue encontra obstáculos para seguir o seu percurso normal, facilmente se percebe porque motivo as manifestações mais comuns incluem as dores no tórax, o edema (inchaço) nos membros inferiores, os desmaios, a cianose labial (lábios de cor azulada) e a fadiga persistente, muitas vezes, mesmo em situações de repouso.
Em termos estatísticos, apesar da inexistência de valores exactos, dados não oficiais referem que existem 70 a 100 casos por milhão de habitantes.
Mais comum nos jovens adultos e, sobretudo, nas mulheres, os doentes acabam por viver angustiados, uma vez que são confrontados com uma doença crónica que, se não for travada atempadamente, pode conduzir a uma morte prematura.
Mas, afinal, quais os factores de risco que podem conduzir à hipertensão pulmonar?
«No meu caso, os médicos não foram capazes de identificar as razões. Por isso, e apesar de ser bastante rara, foi-me diagnosticada uma hipertensão pulmonar primária», comenta Maria João Saraiva, também presidente da recém-criada Associação Portuguesa de Hipertensão Pulmonar (APHP).
Segundo Carvalheira Santos, existem dois tipos de diagnóstico. Originando as mesmas complicações de saúde, no caso da hipertensão primária não é possível identificar as causas.
No que concerne a hipertensão pulmonar secundária, os factores de risco estão bem-descritos. Como fundamenta o especialista, «antigamente esta incapacidade estava associada ao consumo de anorexizantes – fármacos para emagrecer. Retirados do mercado, hoje as causas estão associadas a uma doença cardíaca congénita ou adquirida ou ainda a doenças crónicas de origem reumática, respiratória ou hepática».
Oxigénio precisa-se
Não é fácil um diagnóstico de hipertensão pulmonar. Tal como no caso de Maria João Saraiva, a panóplia de manifestações pode originar falsas verdades que só agravam e retardam o tratamento da doença. Apesar de uma intervenção precoce poder tornar a doença menos incapacitante, podendo a pessoa manter uma vida o mais normal possível, a verdade é que existem vários estádios da doença.
«Existem quatro graus. Num primeiro, falamos de um pequeno cansaço. No segundo, o doente fica fatigado mais facilmente. No terceiro, basta uma pequena actividade física para originar alguma falta de ar, que é recuperada após o repouso. No estádio mais grave, o quarto, bastam pequenos movimentos para que a pessoa fique exausta», refere Carvalheira Santos.
Sendo uma doença crónica e evolutiva, o doente corre sempre o risco de ficar impossibilitado de tomar banho ou vestir--se sozinho e, nos casos mais graves, até mesmo de respirar. Com a situação limite a exigir um transplante de pulmão, existem terapêuticas eficazes que ajudam a controlar a evolução da doença. Para além dos vasodilatadores – dilatam os vasos facilitando a passagem do sangue –, e dos anticoagulantes, é muito comum a oxigenoterapia nos casos de graus três e quatro.
Com as terapêuticas condicionadas à gravidade da patologia, o especialista do Pulido Valente reforça a ideia da necessidade de um diagnóstico o mais precoce possível:
«O doente deverá procurar o médico de família que, posteriormente, deverá encaminhá-lo para um pneumologista ou cardiologista, uma vez que a hipertensão também interfere no sistema cardíaco.»
De facto, mais vale jogar pelo seguro!
Uma jovem associação
Criada em Abril de 2004, a Associação Portuguesa de Hipertensão Pulmonar (APHP) tem ainda muito caminho a desbravar.
O facto de ser uma doença pouco conhecida pela sociedade e sendo também uma doença para a qual nem todos os médicos estão sensibilizados faz com que a APHP se empenhe em a divulgar.
«Em caso de dúvida, é necessário fazer os exames complementares, que garantam um diagnóstico precoce», diz Maria João Saraiva.
Com uma página na Internet – www.aphp.web.pt – a deixar algumas pistas sobre esta doença crónica e incapacitante, a presidente da APHP chama ainda a atenção para a necessidade de se reconhecer a hipertensão pulmonar como uma doença crónica.
«Muitos doentes têm de reformar-se compulsivamente e não têm recursos económicos para suportar as despesas, dado que muitos deles dependem de uma botija de oxigénio para sobreviver», avisa Maria João Saraiva.
Por outro lado, existe, segundo aquela responsável, alguma incoerência ao nível das comparticipações. Em causa está o facto de o regime de comparticipações dos medicamentos e o seu custo não estar ainda definido.
«Não podemos estar sujeitos aos critérios economicistas de algumas administrações que não cedem os fármacos», acusa Maria João Saraiva que, como portadora de hipertensão pulmonar, considera «importante que todos tomem consciência da gravidade desta insuficiência, pois, de outra forma, as consequências podem ser fatais».
Cristina da Cunha Pereira
