Artigo de Medicina e Saúde®
Nº 120 / Outubro de 2007
55 Especial IDOSOS
Entrevistas com:
- Prof. Ricardo Jorge, Ginecologista
- Dr. Miguel Trincheiras, Dermatologosta
- Dr. Borges Guerra, Otorrinolaringologista
- Dr. Mário Sousa Dias, médico de Clínica Geral
Envelhecer não é razão para deixar de viver, muito pelo contrário. Algum tempo livre ganho pela reforma pode dar azo a aventuras até então impossíveis de praticar. Para que possa sorrir à sua idade, deixamos aqui algumas recomendações ao nível da saúde.
Recuando ao 25 de Abril de 1974, a esperança média de vida das mulheres em Portugal era, então, de 65 anos. Hoje em dia, ela já é de 80 anos e este é um dado novo que é preciso considerar.
«Há um prolongamento da vida, em que a função do médico é fazer com que essas mulheres cheguem a uma idade avançada com qualidade de vida. Isso é fundamental», considera o Prof. Ricardo Jorge, ginecologista.
O conceito que se baseia também no prolongamento artificial da vida dos ovários é o que está na génese da terapêutica hormonal de substituição (THS). Se soubermos que a idade média de menopausa em Portugal se centra nos 50 anos, «faz sentido darmos essa terapêutica durante os cinco primeiros anos» defende o médico.
E acrescenta:
«E elas chegam a uma idade mais avançada, com uma boa qualidade de vida». Mas, desde logo, também ressalva: «Não pode haver qualquer contra-indicação, como seja um quadro anterior de cancro de mama. Aí é provável que não se escolha a THS.»
Se falarmos em sintomatologia, existem fármacos para atenuar ou resolver os afrontamentos, a sudorese ou mesmo alguns distúrbios psíquicos temporários. O maior problema virá mais tarde e esse tem um nome: osteoporose.
«Os benefícios dessa terapêutica também se alargam à prevenção de eventos cardiovasculares, bem como à prevenção da incontinência urinária. Temos ainda neste particular a doença de Alzheimer. Esta última não é uma certeza, mas, probabilisticamente, tem grande peso na prevenção dessa demência. Logo, é fundamental que estas mulheres que se encontram numa fase nova das suas vidas sejam acompanhadas», salienta Ricardo Jorge.
O especialista considera que não existe informação suficiente sobre o tema da menopausa e também há quem negue a existência do problema, não querendo pura e simplesmente conhecê-lo, para melhor saber enfrentá-lo.
«Há quem não queira ser informado, mas o que nós também constatamos é que só as mulheres que têm acesso a consultas é que podem ser informadas. Esse deve ser o melhor veículo de informação, se possível com um especialista.
É uma ajuda preciosa ao sucesso da taxa de adesão à THS. Nós sabemos que há muitas mulheres que ficam fora das consultas, porque nem todas dispõem de dinheiro para se deslocarem a um médico privado. As preocupações são outras, como as de colocar alimentos em casa e dar condições de vida dignas aos filhos. Em muitas circunstâncias, a informação prestada também não é correcta. E o Governo parece ter outras prioridades», salienta o médico.
A prevenção, através da THS, assenta em impedir o avanço da osteoporose e a possibilidade de surgimento de cancro da mama. «Há que pesar prós e contras, sem que o médico imponha seja o que for. É a doente que tem de aderir. Eu considero que há mais vantagens do que desvantagens na THS. Não tenho dúvidas de que deve ser aplicada, neste momento. Mas cada caso é um caso», reitera Ricardo Jorge.
Rejuvenescer a pele não é exclusivo das mulheres
Longe vão os tempos em que travar o avanço das rugas era apenas uma preocupação exclusiva das mulheres. É certo que a maior fatia da procura nos tratamentos para «reduzir» a marca do avanço dos tempos continua ligada ao género feminino. Mas o número de homens que buscam por esse tipo de soluções de rejuvenescimento cutâneo «é crescente», atesta o Dr. Miguel Trincheiras, dermatologista, «apesar de continuar a existir, nesse aspecto, uma proporção de nove mulheres para um homem».
Com a progressão para uma idade mais madura, as mulheres consultam o dermatologista para resolverem dois aspectos essenciais, no que diz respeito ao rejuvenescimento da pele. «A flacidez e as rugas são os mais referidos», tal como atesta o especialista.
Já os homens tentam anular os chamados «papos» nos olhos e a queda das pálpebras superiores, onde possa existir excesso de pele. Mas também as rugas na face são escolhidas para serem eliminadas, tanto quanto possível. Embora esse seja um ponto em que há um factor que joga a favor do homem, o que explica a escolha reduzida, por comparação à mulher.
«A barba acaba por dar uma consistência à pele facial de que a mulher não beneficia», refere Miguel Trincheiras. Exemplo paradigmático é o chamado «código de barras» no lábio superior da mulher, algo que não acontece no sexo masculino: «Para além de ter uma pele mais espessa, os folículos pilosos impedem que se formem pregas na pele naquela área.» Daí que sejam as senhoras, em exclusivo, que procuram minorar aquele problema estético.
Tratamentos para envelhecimento cutâneo
Os tratamentos disponíveis para fazer frente a estes sinais de envelhecimento cutâneo facial são variados, desde os menos agressivos e menos invasivos até outros mais invasivos. Miguel Trincheiras enuncia alguns exemplos mais comuns:
«Os ‘peelings’ superficiais, os ‘peelings’ médios, a aplicação local de correntes de radiofrequência para melhorar o aspecto de flacidez, ao remodelar a textura da pele. A tecnologia laser, que é evidentemente mais agressiva, mas que ao ser bem utilizada oferece bons resultados. O recurso aos materiais de preenchimento cutâneo para as rugas mais profundas e aplicáveis essencialmente à metade inferior da face, a mesoterapia com ácido hialurónico, para melhorar o estado de hidratação cutâneo, quer da face, como do pescoço e da área do decote. Ainda a carboxiterapia, que é um método mais invasivo, em que se instila dióxido de carbono debaixo da pele, o que acaba por estimular o metabolismo quer da hipoderme, quer da derme, melhorando a sua textura.»
Estas são algumas opções, numa lista infindável. Há quem avance com «pés de lã», há quem não olhe para trás. No entanto, o médico insiste que cada caso é um caso.
E vai mais longe. Qualquer solução a aplicar é discutida com a pessoa, que terá sempre uma última palavra, avaliando prós e contras.
«É preciso lembrar que o tratamento de uma pessoa é efectuado por acordo entre ela e o médico, segundo as várias técnicas disponíveis e aquilo a que a que cada um quer sujeitar-se, incluindo a equação de eventuais períodos de baixa, por exemplo», aponta Miguel Trincheiras. Até porque este tipo de tratamentos, como qualquer outro, «induzem efeitos indesejáveis, caso os aparelhos não sejam bem manejados e as técnicas devidamente aplicadas».
O ouvido também envelhece
A perda de audição (parte coclear do ouvido) e do equilíbrio são, no plano da especialidade de Otorrinolaringologia, os problemas que mais frequentemente afectam o idoso e também os mais importantes, necessitando de uma resolução mais urgente.
O fenómeno da perda auditiva no idoso, denominado presbiacusia, é próprio do envelhecimento, tal como assinala o Dr. Borges Guerra, otorrinolaringologista do Hospital de Pulido Valente, em Lisboa:
«É a perda de audição, por desgaste natural, que começa por notar-se com mais insistência a partir dos 45/50 anos. Em certos casos pode acontecer mais cedo, noutros mais tarde, no entanto, é nesse período que começa a desencadear-se um processo involutivo que leva à deterioração das estruturas nervosas do ouvido e das vias de condução e dos centros auditivos.»
Há vários outros factores que podem suscitar a perda de audição, nomeadamente, doenças otológicas, lesões ototóxicas ambientais, traumatismo craniano, alcoolismo, fumar e mesmo a toma de alguns medicamentos. Ou seja, são situações que, pelas suas propriedades, contribuem para danificar a acuidade do órgão auditivo. Por outro lado, sustenta o especialista, «há doenças que também são comuns e que podem revelar-se nocivas para o ouvido, como as vasculares, as familiares/genéticas e as metabólicas».
Seleccionar os doentes para adopção de aparelho
Existe quem tenha a consciência de que precisa de ajuda, porque amigos ou familiares lançam o alerta, perante episódios quotidianos. Todavia, ao encontrar-se com o médico, a pessoa «quer perceber se ouve mal por ‘culpa’ própria ou se os outros é que não se exprimem devidamente», anota Borges Guerra.
Entra igualmente em jogo um factor de negação do problema auditivo, que constitui entrave ao tratamento, «sobretudo nas primeiras fases, em que já existe um défice nesse sentido», acrescenta o especialista. «Normalmente, o mal é dos outros: articulam mal as palavras ou falam baixo. ‘Eu ouço, mas não percebo’ é um argumento habitual. Este fenómeno tanto ocorre em homens como em mulheres.
Quando surge a necessidade de um aparelho auditivo, entra em campo o factor económico. A partir daí é preciso ponderar qual o mais acertado e de que forma essa solução vai adequar-se ao indivíduo. A questão económica põe-se ainda mais a quem precisa de aparelhar os dois ouvidos. No entanto, «o ideal seria aplicarmos a regra de que se colocamos duas lentes nos olhos, também deveríamos colocar um aparelho em cada ouvido para mantermos correctamente a função», afirma Borges Guerra.
Em relação à funcionalidade dos aparelhos, «hoje em dia eles são, indubitavelmente, melhores do que eram há alguns anos», diz o médico. A principal questão reside no preço elevado.
Para uma prescrição correcta Borges Guerra sugere que os
doentes devem ser submetidos «a uma selecção, tendo em conta a patologia subjacente, a gravidade e têm de ser reavaliados quer por um otorrinolaringologista, quer por um audiologista no sentido de serem aparelhados correctamente. É preciso assegurar também que o preço a pagar pela pessoa que necessita desta medida terapêutica seja adequado às suas necessidades». Este pressuposto nem sempre é possível de atingir sem haver apoio social através de comparticipação parcial ou total.
Perda de equilíbrio é queixa frequente
A outra queixa também muito frequente consiste na perda de equilíbrio ou estabilidade. Para manutenção da postura e do equilíbrio na marcha necessitamos que os nossos olhos, ouvidos (parte vestibular do ouvido) e sistema proprioceptivo (sensores musculares e articulares) funcionem em sintonia.
«Se um dos sistemas não funciona ou funciona mal (caso de um invisual) os outros sistemas fornecem informações suficientes para que o cérebro, dentro de determinados limites, possa manter a postura e a correcção na marcha», afirma Borges Guerra.
O que acontece no idoso é que de uma forma geral todos os sistemas de que falamos acima se encontram perturbados. «Pelo que se torna muito difícil ao cérebro, também já de si com alguma deficiência, controlar as informações defeituosas ou inexistentes e actuar de forma a manter o equilíbrio», salienta o médico.
Quem já experimentou a desagradável sensação de queda ou que tenha caído, mesmo sem se magoar muito, fica limitado na sua capacidade de se deslocar, podendo ficar dependente de terceiros.
Existem hoje mecanismos físicos de ajuda a estas pessoas, assim como programas de reabilitação, «que procuram melhorar as capacidades residuais dos diversos sistemas envolvidos e criar maior confiança na utilização dessas mesmas capacidades», anota o especialista.
O cérebro também se exercita aos mais idosos
A performance intelectual em pessoas sãs mantém-se até muito tarde (próximo dos 80 anos), embora possa haver uma certa moderação em determinadas funções e, neste sentido, a memória pode pregar algumas ‘partidas’: datas, nomes, acontecimentos recentes são exemplos frequentes de ‘esquecimentos’.
É claro que os graus de envelhecimento dependem das características próprias de cada indivíduo no que respeita à genética e ao meio ambiente», refere o Dr. Mário Sousa Dias, médico de Clínica Geral.
Isto não inclui as consequências de certas patologias graves que afectam a memória como a doença de Alzheimer ou as doenças vasculares cerebrais. Em relação ao fenómeno de envelhecimento do cérebro, no que toca à memória, é afectada sobretudo, de acordo com o clínico, «a chamada memória recente, no que diz respeito a acontecimentos actuais. A memória antiga, digamos do passado, é pouco atingida neste âmbito particular».
Ora, como qualquer outro órgão do corpo humano, para obter a melhor resposta possível no «processamento» da informação que o cérebro recebe no dia-a-dia, é preciso mantê-lo... em forma.
Se há quem não pense muito nisso, vale a pena tomar em consideração alguns conselhos simples para treinar um órgão tão importante e não ficar parado à espera que a idade passe. Diz Mário de Sousa Dias que «o sudoku é uma boa prática para manter a actividade cerebral, mas também os jogos de palavras cruzadas e até, mais recentemente, alguns jogos informáticos que ajudam a manter o cérebro em modo activo, através das possibilidades que oferecem».
Texto: David Carvalho