Artigo de Medicina e Saúde®
Nº 118 / Agosto de 2007
54 Radiografia - Hospital Residencial do Mar
Não muito diferente de uma unidade hoteleira, no que diz respeito a arquitectura e condições, o Hospital Residencial do Mar dedica-se, fundamentalmente, a situações específicas da terceira idade e de apoio à dependência.
O moderno e o antigo coabitam em harmonia, a fachada principal mantém a arquitectura original de uma escola de Agronomia. Nos espaços exteriores, as oliveiras não enganam no que respeita à antiguidade do local. Neste espaço, outrora também uma Estação Agronómica, situado na zona ribeirinha, junto ao Parque das Nações, funciona há pouco mais de um ano o Hospital Residencial do Mar.
Visitámo-lo e a paisagem circundante, bem como os
acabamentos e decoração interiores, colocavam em segundo plano o facto de ser uma unidade hospitalar. Muito semelhante a um verdadeiro hotel, este hospital dedica-se, sobretudo, aos cuidados continuados nas áreas de Reabilitação e Convalescença, Neuroestimulação e Cuidados Paliativos.
«Através de um leque variado e completo de serviços, o Grupo Espírito Santo Saúde pretende dar resposta às diversas situações características da terceira idade e das pessoas com dependência», explica o Dr. Manuel Caldas de Almeida, director do Hospital Residencial do Mar.
Ao ser uma unidade especializada, é uma peça essencial entre o Hospital da Luz, que tem Serviço de Urgência, internamento de agudos e unidades de diagnóstico e as soluções residenciais para idosos com ou sem dependência.
«Na lógica de resposta global, na medida do possível, temos como objectivo principal maximizar a autonomia dos utentes inseridos nas diferentes unidades, em regime de internamento ou de ambulatório», indica Manuel Caldas de Almeida.
Reabilitação e convalescença
A Unidade de Reabilitação e Convalescença está dividida na área de cuidados geriátricos e de convalescença.
«Recebemos doentes que sofreram acidente vascular cerebral (AVC), pessoas que se encontram no período pós-operatório, por exemplo, com próteses, em especial do colo e do fémur, ou com doenças crónicas necessitando de estabilização ou reabilitação», indica a Dr.ª Ana Cristina Costa, gestora de clientes do Hospital do Mar, referindo-se aos doentes que são encaminhados para aquela Unidade.
«O trabalho de reabilitação é bastante intenso e sempre efectuado com o intuito de conferir mais autonomia ao doente, para que consiga reaprender as tarefas do quotidiano e concretizá-las sozinho em sua casa», diz o director do Hospital.
Neuroestimulação
Munida de clarabóias, com corredor em forma de «U» com amplas janelas no topo, para o exterior, bem como de um pequeno jardim exterior.
Estas características arquitectónicas foram especialmente concebidas para conferir uma sensação de liberdade aos doentes que se encontram nesta zona do Hospital, devido à entrada constante da luz do dia no local. Trata-se da Unidade de Neuroestimulação, onde é feito o tratamento e reabilitação de vários tipos de doenças crónicas, sobretudo demências, com a doença de Alzheimer como principal patologia.
«Também pretendemos estimular a função e a relação com os pares com a liberdade que damos aos doentes de poderem deslocar-se em todo o espaço», diz o mesmo director, ressalvando:
«Conseguimos estimular a morbilidade em sensação de liberdade, num espaço muito seguro, sendo impossível eventuais fugas, porque para se entrar ou sair da Unidade é necessário introduzir um código, que serve para abrir a porta.»
Cuidados paliativos
Destinada a patologias permanentes, a Unidade de Cuidados Paliativos recebe doentes não apenas com patologias do foro oncológico, mas qualquer outra de cariz crónico, que conduza a um estádio terminal.
Servem de exemplo as neurológicas degenerativas, em que muitas vezes se torna complicado manter a pessoa em casa, por questões técnicas ou suporte familiar. Assim, de modo a auxiliar a família, os internamentos tanto podem ser temporários como definitivos.
Os profissionais fazem o controlo dos sintomas e lutam para que o doente tenha uma melhor qualidade de vida.
«Mesmo associados a períodos terminais e a grande sofrimento, possuímos a tecnologia médica para reduzir o sofrimento, com um forte envolvimento familiar.
Pretendemos que as pessoas se sintam com a segurança hospitalar, mas num ambiente de conforto, como se estivessem na sua própria casa», sublinha Manuel Caldas de Almeida.
Ambulatório e internamento
Nestas três áreas, além do internamento, o Hospital Residencial do Mar tem produtos de ambulatório.
O internamento destina-se a pessoas que carecem de um trabalho mais intenso. Já os serviços de ambulatório funcionam como instrumento no melhoramento da qualidade de vida.
Antes de qualquer indivíduo integrar algum serviço, é feita uma análise e avaliação da situação por uma equipa multidisciplinar.
«Com base na lista de problemas, criamos objectivos para equilibrar e melhorar a situação ao nível funcional, orgânico e neurológico, de uma forma personalizada. Isto com o principal objectivo de promover a autonomia e não apenas a reabilitação física, de forma a reaprenderem a realizar tarefas com o défice actual sem dependerem de outros», menciona Manuel Caldas de Almeida.
O ambulatório funciona como uma espécie de porta de entrada através das consultas médicas (Neurologia, Medicina Interna, Clínica Geral, Fisiatria), da Clínica da Memória e da Clínica Geriátrica.
«Na Clínica da Memória fazemos a avaliação médica e o diagnóstico até ao estadiamento da doença. Além do apoio médico, funcional e cognitivo, podemos dar apoio jurídico e financeiro», explica o director deste hospital, acrescentando:
«Este tipo de apoio serve, por exemplo, para uma pessoa ainda numa fase inicial de uma demência, em que ainda tem a capacidade de providenciar garantias futuras, nomeadamente, ao nível do tratamento ou da aplicação de capitais.»
O aconselhamento, do ponto de vista médico e funcional, é um dos serviços da Clínica Geriátrica, onde, igualmente, se trabalha no sentido de melhorar o ambiente do doente, de modo a que tenha melhor qualidade de vida, sugerindo alterações na própria casa, por exemplo.
Quanto ao Centro de Dia, como o nome indica, destina-se a utentes que, após um determinado período do dia, regressam ao domicílio. Contudo, quando previamente estabelecido, é possível permanecerem no Centro durante uma semana ou mais.
«Os períodos em que os utentes estão no Centro de Dia são aproveitados para estimulação e suporte técnico. Acontece, em alguns casos, recebermos utentes que iniciaram o processo de reabilitação e que já não necessitam do internamento efectivo, mas querem continuar a dar continuidade ao tratamento, passando a frequentar o Centro», refere Ana Cristina Costa, sublinhando:
«Considero que é uma prova das boas relações que se estabelecem e da confiança que é depositada nos profissionais. Penso que também significa reconhecimento do trabalho desenvolvido em internamento.»
Ainda em fase de instalação
«Estamos na fase de instalação, afinal, iniciámos a actividade em Maio de 2006», comenta Manuel Caldas de Almeida, prosseguindo:
«A própria equipa ainda está a crescer, pois, investimos bastante na formação, que é morosa e exige um enorme esforço, devido à complexidade das áreas abrangentes.»
É, pois, objectivo para esta unidade hospitalar completar a
instalação nos próximos dois anos e alcançar o break-even.
De acordo com o seu director, «temos tido o reconhecimento das pessoas em relação à área de internamento, mas gostaria de obter também nos serviços de ambulatório».
De futuro, também se pretende aumentar acordos com outras entidades de âmbito privado e estatal. Actualmente, por exemplo, o Hospital Residencial do Mar tem um acordo com a ARS Lisboa para 30 camas, no âmbito da legislação de cuidados continuados, uma experiência-piloto a decorrer em todo o País.
DIA-A-DIA DOS DOENTES
A Medicina Física é o grande enfoque dos doentes que estão na Unidade de Reabilitação e Convalescença.
Após a higiene, têm depois o acompanhamento da terapeuta ocupacional, que os ajuda nas actividades quotidianas, para poderem ser autónomos dentro das suas capacidades e à medida que vão progredindo», relata a Dr.ª Ana Cristina Costa, gestora de clientes do Hospital Residencial do Mar, sublinhando:
«A nossa filosofia é promover o máximo possível a autonomia dos pacientes. Na sala de terapia ocupacional há uma cozinha para que os utentes treinem actividades tão simples como tirar um copo do armário, colocar a mesa ou ligar o fogão.»
De seguida, até à hora de almoço, têm horas marcadas para a fisioterapia e terapia ocupacional, de forma alternada.
Depois da refeição, se não têm nenhuma actividade programada a nível de recuperação, vão para a sala lúdico-ocupacional, onde realizam tarefas com uma componente terapêutica.
«Os doentes que estão na Unidade de Neuroestimulação, cuja duração do internamento é superior, têm um programa idêntico, mas a maior parte do tempo estão na sala lúdico-ocupacional, onde se dedicam a actividades como o treino da escrita, associações entre objectos ou realização de recortes, etc. Também fazem fisioterapia, porque vão perdendo as faculdades», indica Ana Cristina Costa.
«Há várias fases e níveis de demência e as actividades são condicionadas de acordo com cada grupo. Não se juntam doentes com demências ligeiras com profundas», acrescenta a gestora de clientes.
Em qualquer altura, os doentes podem receber a visita dos seus familiares. Não há horário de visita estipulado e têm permissão para entrar no hospital e participar nas várias actividades, sendo essenciais as reuniões regulares, de modo a que a família tome conhecimento do plano de trabalho.
Os visitantes que não têm identificação familiar só podem entrar após identificação e autorização prévia da família.
Uma característica interessante dos quartos de internamento da Unidade de Reabilitação e Convalescença é a existência do «cockpit», uma consola com ecrã, onde é possível consultar a Internet, fazer chamadas telefónicas e ver televisão. Tem a particularidade de estar fixo no tecto, podendo ser movido para qualquer local do quarto.
TESTEMUNHOS:
Maria Júlia Simplício, 74 anos, reformada
– Por que motivo está no Hospital do Mar?
– Sofri um acidente vascular cerebral há três meses. Após ter estado internada no Hospital de Curry Cabral, fui para o Hospital de Santa Cruz, porque tive de ser operada ao coração. Vim para este hospital para recuperar. Estive no internamento durante dois meses, tive alta hospitalar e como senti uma enorme saudade do ambiente venho para o Centro de Dia três vezes por semana.
– O que tem a dizer sobre o atendimento?
– Já estive em outros hospitais e há uma diferença muito grande. Nos outros havia pessoas muito queridas, mas como aqui não tinha encontrado. É do melhor que há. Sou estimada por todas as pessoas.
– Indique o pior e o melhor desta unidade?
— Só há uma coisa que podia ser melhor: a alimentação. De resto, é tudo óptimo!
Bernardino Ramos, 66 anos, reformado
– Por que razão está internado?
– Vim para Portugal na sequência de um acidente que tive em Cabo Verde, em que fracturei vértebras no pescoço e fiquei parcialmente tetraplégico. Fui operado no Hospital de Santa Maria, estive no Centro de Medicina de Reabilitação três meses e meio, voltei para o primeiro hospital onde estive para ser novamente operado. Passado um mês tive alta e vim para o Hospital do Mar fazer reabilitação.
– O que tem a dizer sobre o atendimento?
– Estou cá há 50 dias e até à data classifico-o como muito bom.
– Diga um aspecto negativo e um positivo acerca do internamento?
– Tenho muitas saudades do sol. Em Cabo Verde temos sol todo o ano.
O que gosto mais é das pessoas, que são carinhosas e tratam-me muito bem, o que para mim já é excelente.
Texto: Sofia Filipe
Fotos: Jorge Correia Luís