Artigo de Medicina e Saúde®
Nº 114 / Abril de 2007
52 Opinião - O papel do médico dentista na oncologia oral
Nos próximos dias 20 e 21 de Abril de 2007 irá realizar-se no anfiteatro da Culturgest o Simpósio intitulado «O papel do médico dentista na oncologia oral».
Esta reunião representa uma iniciativa inédita e conjunta entre o Instituto Superior de Ciências da Saúde Egas Moniz e o Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do IPOLFG – EPE, tendo como patrocínio científico a Faculdade de Medicina Dentária da Universidade de Lisboa, a Sociedade Portuguesa de Estomatologia e Medicina Dentária, a Ordem dos Médicos Dentistas, a Sociedade Portuguesa de Oncologia, a Sociedade Portuguesa de Cirurgia Oral e a Associação Nacional de Cuidados Paliativos.
A organização deste evento científico encontra-se a cargo do Dr. Rosa Santos e da Dr.ª Sara Mendes, assistente de Oncologia Oral do Curso de Medicina Dentária do ISCSEM, e tem como objectivo constituir uma sessão de formação dirigida essencialmente à classe dos médicos dentistas, estomatologistas, cirurgiões maxilofaciais e estudantes de Medicina Dentária.
A realização desta iniciativa só se tornou possível com o envolvimento dos patrocínios presentes dos quais destacamos o apoio desde a fase de concepção do projecto dos HPP – Hospitais Privados de Portugal, SA.
Desde há vários anos, o Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do IPOLFG tem estado envolvido no ensino pré-graduado do curso de Medicina Dentária, assumindo a regência da cadeira de Oncologia Oral no ISCSEM.
Este envolvimento do Serviço, juntamente com o contributo prestado pelo Prof. Doutor Carlos Zagalo, através da cadeira de Patologia Oral, tem permitido aos alunos de Medicina Dentária do ISCSEM o enriquecimento dos seus conhecimentos teóricos na área da Oncologia, o contacto com a patologia oncológica na cavidade oral e a sua sensibilização para a necessidade de encaminhamento precoce destes casos para centros de referência. Este contacto dos alunos com o IPOLFG tem tido o apoio de todo o quadro médico do Serviço, cabendo-lhes um papel inestimável no apoio a esta docência.
Tendo dedicado a vida profissional à cirurgia oncológica de cabeça e pescoço e aos tumores da cavidade oral, é nossa convicção que a solução para a inversão da tendência que se tem registado nas últimas décadas com acréscimo de mortalidade não está na melhoria dos métodos terapêuticos disponíveis, mas sim na prevenção primária e no diagnóstico precoce destas situações.
Só assim conseguiremos reduzir a percentagem de estádios avançados da doença, reduzindo o número de doentes com sequelas estéticas e funcionais resultantes de terapêuticas mutilantes e por outro lado, aumentando o número de casos precoces passíveis de terapêuticas menos agressivas com uma alta probabilidade de cura.
É neste ponto que os médicos dentistas têm um papel preponderante. São eles que constituem a primeira linha no despiste e encaminhamento terapêutico de todas estas situações.
Mas, para que este objectivo possa ser cumprido, é necessário sensibilizar estes clínicos para o problema que constitui as doenças oncológicas da cavidade oral, assumindo eles próprios o papel fundamental na prevenção, no despiste de lesões com um grande potencial de malignização, e no diagnóstico precoce e encaminhamento dos doentes portadores de neoplasias da cavidade oral.
É necessário também alterar o papel do médico dentista no âmbito do SNS, procurando integrar estes clínicos nos Hospitais e nos Cuidados Primários de Saúde.
Em Portugal, são diagnosticados anualmente cerca de 64.000 novos casos de cancro, excluindo o cancro cutâneo. Cerca de 4% correspondem a carcinomas da cavidade oral, pelo que se calcula uma prevalência anual de cerca de 2600 novos casos.
Cerca de 70% são diagnosticados em fases avançadas da doença, não sendo expectável sobrevidas superiores a 20% aos cinco anos, apesar do enorme deficit, com consequentes repercussões na reintegração destes doentes no seu meio socioprofissional e familiar. Dos 30% de casos diagnosticados em fases mais precoces da doença, a sobrevida aos cinco anos é de cerca de 70%, com um deficit funcional reduzido e com manutenção de uma excelente qualidade de vida.
A causa do atraso no diagnóstico dos doentes portadores de doenças oncológicas da cavidade oral prende-se com varias razões.
Em primeiro lugar, deficiências na preparação pré e pós-graduada, dos clínicos gerais, estomatologistas e médicos dentistas na observação, diagnóstico e encaminhamento destas situações.
Em segundo, por problemas relacionados com as carências económicas e financeiras da população e com a enorme limitação da acessibilidade aos cuidados de saúde oral que esta situação acarreta.
Em terceiro lugar, pelo medo do próprio doente em encarar a possibilidade de poder ter um cancro.
Para inverter esta situação é necessário melhorar a formação dos médicos dentistas na área da Oncologia Oral, melhorar a acessibilidade da população aos seus cuidados, promover campanhas para redução do uso de factores etiológicos conhecidos, identificar e tratar as lesões de pré-cancerose e organizar campanhas eficazes de rastreio.
É intenção deste simpósio contribuir para estes objectivos, incorporando desta forma na Medicina Dentária, os princípios científicos, humanísticos e sociais que caracterizaram o exercício da Medicina.
Dr. Jorge Rosa Santos
Director do Departamento de Cirurgia e do Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do IPOLFG. Professor de Oncologia Oral do Curso de Medicina Dentária do ISCSEM.