Artigo de Medicina e Saúde®
Nº 108 / Setembro de 2006
10 Opinião: 300 milhões de obesos
- Dr. Álvaro Cidrais
No mundo dito desenvolvido, passamos um ciclo de pandemias com graves consequências económicas: gripe das aves, diabetes, obesidade, etc. Estas doenças irão gerar a ruptura dos sistemas de saúde.
Perante as pandemias é preciso agir de modo diferente e já. Mas os resultados só serão visíveis daqui a 10 anos.
Historicamente, nunca passámos por uma experiência de múltiplas pandemias sobrepostas: gripe das aves, SIDA, cancro, obesidade e diabetes. Esta é uma novidade que associada às expectativas das sociedades desenvolvidas só poderá ser combatida com uma abordagem centrada nas práticas da procura (dos utentes) e na participação envolvida dos cidadãos.
Caso ocorra a gripe das aves, serão inúmeras as empresas que encerrarão temporariamente as portas. Algumas abrirão falência. Haverá, muito provavelmente, uma regeneração económica do sector farmacêutico e da área da saúde.
Criam-se novas dinâmicas de mercado. Verificando-se os cenários mais pessimistas, assistiremos a uma reconfiguração da economia como ocorre nos períodos de guerra, de terramotos e das grandes catástrofes. Mas, neste caso, a uma escala global.
De acordo com as expectativas mais pessimistas dos especialistas da obesidade, reunidos no passado mês de Setembro, em Sidney, na Austrália, o mundo desenvolvido possui já cerca de mil milhões de pessoas com excesso de peso e 300 milhões de obesos.
A obesidade é considerada uma doença crónica de difícil tratamento, com elevado custo económico e fortes implicações no desenvolvimento de outras maleitas, como a diabetes, a hipertensão arterial e diversos problemas cardiovasculares.
A pandemia da obesidade cresce fruto de maus hábitos alimentares e de vida, bem como da má educação para a saúde individual, familiar e comunitária. Será um problema complexo e duradouro, capaz de, só por si, gerar a ruptura dos sistemas de saúde com gestão pública.
O crescimento da incidência desta doença – também bem visível nas praias de Portugal – irá criar uma maior pressão sobre o sistema de saúde nacional, promovendo, no seu já debilitado equilíbrio económico, a sua falência.
Confrontados com a ruptura do sistema público de saúde, estaremos perante a ameaça da diminuição da qualidade de vida dos cidadãos. Efectivamente, nos países onde o sistema privado é dominante, a saúde não é para todos, apenas os mais ricos beneficiam de bons níveis de cuidados!
Como tal, torna-se essencial começar a agir com empenhamento no combate à obesidade de acordo com as novas concepções de saúde. De facto, esta doença é das que podem ser controladas antes de ocorrerem, pela promoção de hábitos saudáveis na família e na comunidade. Tem uma elevada componente de informação e de participação da sociedade civil.
Esta maleita combate-se pela educação dos cidadãos (no lado da procura dos sistemas de saúde) e não, como é habitual nos modos mais convencionais, pelo aumento da qualidade da prestação de serviços e pela inovação terapêutica (no lado da oferta de serviços de saúde).
Pode ser que a nova abordagem de Cuidados Primários venha a contribuir para agir sobre este problema, mas, falta ainda muito para que as mudanças iniciadas possam ser avaliadas. Até porque, em Portugal, as inovações em saúde costumam gerar fracassos e refluxos de frustração que duram cerca de três a seis anos, até que uma nova reforma recupera a boa ideia. Daqui a 10 anos veremos o que acontece!
Dr. Álvaro Cidrais
Geógrafo e Consultor