Artigo de Medicina e Saúde®
Nº 106 / Agosto de 2006
22 Saúde Infantil: Opinião - Hospital? Não, obrigada!
- Enf.ª Paula H. Abreu
Porque durante quase uma década trabalhei num Serviço de Pediatria com toda a paixão e dedicação que o melhor do mundo merece, decidi partilhar convosco, senhores leitores, um relembrar de pequenas coisas no que respeita à Hospitalização da Criança.
Seja esta de apenas algumas horas, dias ou até meses, de urgência ou programada, certamente que «lugar de criança não é no hospital».
Mas, já que a realidade impera e os avanços da Medicina felizmente acontecem, então vamos continuar a tratar as nossas crianças doentes da forma menos traumática e mais formadora possível!
Agrada-me saber que, actualmente, os serviços de Pediatria esforçam-se pela prestação de cuidados individualizados e humanizados que a Carta da Criança Hospitalizada descreve tão bem nas suas 10 alíneas, no sentido da humanização dos serviços de atendimento à criança no hospital. Este algumas vezes com um insuficiente número de profissionais ou com más condições físicas e estruturais dos serviços.
A formação académica tem aqui um papel fundamental, para que os cuidados sejam adequados à idade da criança, à sua fase de desenvolvimento e de acordo com o seu contexto familiar, sociocultural e até religioso... Mas não deixemos que essas dificuldades sirvam, muitas vezes, de desculpa, pois um acolhimento assertivo, humanizado e simpático agrada qualquer pai/mãe/cuidador e tornam-no parceiro no cuidar daquela criança que em tudo irá beneficiar de ter alguém familiar junto dela.
Aos profissionais pede-se que saibam reconhecer a ansiedade dos pais causada muitas vezes pelo medo do desconhecido, do que irá acontecer, da possibilidade de se separar do filho, quais os procedimentos seguintes e quando, e como, etc., etc., etc..
Da minha prática diária penso que é preciso escutá-los e informá-los, de forma faseada, clara e sem subterfúgios, em simultâneo, dar-lhes a possibilidade de fazer coisas simples como tocar, cantar, mimar, trazer peças de roupa significativas, o brinquedo favorito, estar ao lado, disponibilizar o telefone, se possível permitir música viável e adequada às crianças internadas, enfim... para que o peso do hospital não pese tanto!
Aos pais, cabe-lhes perceber que o objectivo daquela hospitalização é uma forma de o seu filho ser tratado e voltar a estar bem e a ter uma vida normal, a partir daí, ajudar a criança a tomar consciência de que os profissionais estão ali para ajudar (crianças a partir dos 2 anos), então a experiência hospitalar será positiva, menos traumática e geradora de um stress negativo.
Em internamentos ou cirurgias programadas, é claramente sabido que a prática da preparação pré-operatória feita pelos enfermeiros é de extrema importância para uma hospitalização mais securizante e tranquila.
A criança «maior» e pais devem compreender o motivo do seu internamento, aceitá-lo e se possível colaborar nele, para isso, nesta preparação pré-operatória haverá espaço para informação, perguntas, manuseamento de objectos hospitalares, imagens, com o objectivo de familiarizar a criança/pais com os profissionais e ambiente hospitalar, assim o tal medo do desconhecido poderá ser minimizado.
Pode-se recorrer a desenhos, pequenos teatros, brincadeiras, contacto com situações similares para facilitar esta preparação. Os pais ficam menos ansiosos e mais capazes de acalmar e sossegar os filhos.
Os cuidados são prestados de forma mais calma, menos traumática e realmente terapêutica, a criança terá alta como muitas vezes me lembro, sorrindo, dando um beijinho ou um abraço sincero e apertado como só as crianças dão! Faz-nos sentir que é nobre e gratificante a arte de cuidar em pediatria.
A relação entre pais e filhos fortalece-se com a experiência da vida, o hospital, esse «não foi assim tão mau mãe!», é preciso não estar só. Como escreveu Sebastião da Gama:
«Quando vem alguém
Não há hospital.
Há doces, há livros
Notícias da rua.
Conforto de amigos.»
Enf.ª Paula H. Abreu,
Enfermeira graduada do Centro de Saúde de Sesimbra