Artigo de Medicina e Saúde®
Nº 105 / Julho de 2006
64 Associação Coração Amarelo - Combater a solidão na 3ª idade
Lisboa alberga mais de 130 mil idosos. Cerca de 33 mil convivem com a solidão. Vários podem ser os motivos para que tanto saber e experiência sejam votados ao isolamento.
«A vida de hoje é muito complicada. Há problemas familiares, as pessoas têm as suas próprias casas, enquanto antes chegava a haver três e quatro gerações na mesma habitação familiar. Os compromissos profissionais retiram tempo para a família e as habitações nas periferias são mais baratas, o que leva os mais novos a irem morar para longe dos mais velhos. Há vários motivos e as pessoas vão ficando cada vez mais sós», refere a Enf.ª Manuela Marques Alves, fundadora e actual responsável da Associação Coração Amarelo.
A população portuguesa está a envelhecer. A esperança média de vida vai aumentando, mas, infelizmente, nem sempre o aumento da longevidade foi acompanhado pelo aumento da qualidade de vida a que as pessoas têm direito.
A Associação Coração Amarelo promove, desde 2001, inúmeras actividades de forma a dar apoio e combater a solidão na terceira idade.
De acordo com a enfermeira, «esta é uma Instituição Particular de Solidariedade Social e pretende ser o motor do desenvolvimento social da criação de projectos de vida das pessoas mais velhas».
Habituada, com algumas das suas colegas, a lidar com estas situações numa base diária, a enfermeira juntou-se a mais seis técnicas e lançaram mãos à obra com o propósito de criar a associação.
«Esta associação foi criada por sete mulheres, todas elas técnicas, que trabalham em campo, ou seja, que conhecem a realidade da população idosa lisboeta. Decidimos juntarmo-nos e criar a associação para que pudessemos, em conjunto, fazer o que fazíamos individualmente, numa tentativa de melhorar a qualidade de vida de muitas pessoas na cidade de Lisboa. O nosso principal objectivo é combater a solidão», salienta a enfermeira.
Toda a estrutura funcional da associação está suportada pelo voluntariado ou pelos apoios que esta instituição vai recebendo e recolhendo, dividindo a sua actividade quer em serviços ao domicílio, quer enfrentando, com os idosos, as pequenas tarefas do dia-a-dia, tais como ir ao banco ou aos correios.
«As nossas actividades são desenvolvidas por voluntários devidamente seleccionados e formados. Quanto ao acompanhamento que prestamos, tanto pode ser no domicílio como no exterior», esclarece Maria Manuela Alves, continuando:
«Nas situações domiciliárias, procuramos ler, conversar, ou simplesmente fazemos companhia aos nossos idosos. Saber ouvi-los é o que eles mais precisam. Muitas vezes a única ponte com o mundo exterior é o cão ou o gato. Também acompanhamos os idosos ao banco, aos correios ou ao café.
Ajudamos nas situações do dia-a-dia e organizamos passeios pela cidade de Lisboa e até mesmo pelo País.»
Recebemos sempre mais do que damos»
A verdadeira força de um projecto com estas características, que vive e sobrevive do voluntariado, reside naqueles que dão um pouco deles, o que para outros é, muitas vezes, um gesto enorme.
«Os nossos recursos humanos são voluntários. São a nossa mais-valia. A certeza que podem ter é a de que recebem sempre mais do que dão. Quanto aos nossos beneficiários, não pagam, quanto muito, se tiverem possibilidade, são nossos sócios ou então são os familiares. Temos de ter alguma ajuda, pois, temos despesas de manutenção. As quotas e os subsídios que aparecem de vez em quando são as nossas receitas, mas estamos sempre à procura de mais apoio, para termos a possibilidade de fazermos mais», refere a responsável pela associação.
Muitas vezes, o processo de ajuda sofre um efeito cíclico em que muitos dos que foram ajudados passam, também eles, a ajudar.
«Às vezes, aparecem-nos voluntários que também precisam de ajuda no aspecto da solidão. Temos tido bastante sucesso nesse campo. Muitos dos que encontram aqui a solução do seu problema tornam-se, eles próprios, a solução para o problema dos outros.
É, para nós, uma situação bastante gratificante», salienta a enfermeira.
Actualmente, a instituição dá apoio a 130 idosos espalhados por várias freguesias de Lisboa, fruto de várias parcerias e protocolos com entidades como a Câmara Municipal de Lisboa, a Plataforma Saúde em Diálogo, as Juntas de Freguesia de Nossa Senhora de Fátima e de São João de Deus, a Escola Superior de Saúde Ribeiro Sanches e a Universidade Lusófona. Num outro nível, a associação tem também uma parceria com a Santa Casa de Misericórdia de Lisboa e a Cruz Vermelha, delegação de Lisboa, num projecto denominado «Mais Voluntariado, Menos Solidão».
Para os interessados, o contacto com a associação «pode ser feito directamente pelas pessoas aqui na associação, através das juntas de freguesia, dos centros de saúde, da Santa Casa da Misericórdia ou da Cruz Vermelha», diz Maria Manuela Marques Alves.
Texto: Rui Miguel Falé