Artigo de Medicina e Saúde®
Nº 105 / Julho de 2006
56 Opinião: SNS: reforma ou falência
- Dr. José Marques
«A mudança conceptual que se perspectiva levará os cuidados de saúde a deixarem de ser definidos como uma luta contra a doença para passarem a ser definidos como a manutenção do funcionamento físico e mental da pessoa», segundo Peter Drucker.
O ministério dito «da saúde» tem de deixar de ser sobretudo o ministério da doença. Se não caminharmos rapidamente para o desafio proposto corremos o risco da ruína completa do sistema em termos sociais, técnicos, económicos e financeiros.
Para que de uma forma planeada se prepare o futuro através da definição estratégica de medidas e modelos ajustados à defesa de um SNS, de um Sistema de Saúde centrado na satisfação das necessidades das Pessoas /Doentes e com o respeito absoluto pelo direito à saúde dos cidadãos portugueses, conforme está consignado na Constituição da República Portuguesa. Temos de reformar:
1. Administração do Sistema
Planeamento estratégico como base de decisão; aplicação do contrato de gestão com equipas de gestores profissionais; experimentar outros modelos de gestão; centralização das compras/base nacional/base regional; criar o jornal do SNS/suporte virtual/papel; criar a SNS/TV; serviços de logística por contrato de prestação externa, na base da articulação interserviços ao nível: local/concelhio/distrital/sub-regional/regional; transportes de doentes; outros transportes; serviços domiciliários; serviços de alimentação; higiene e limpeza; segurança; tratamento de resíduos; manutenção; acordar tabelas de preços base de prestações externas; estabelecer prazos máximos de pagamento a fornecedores/90 dias; desenvolver a complementaridade dos serviços; fixar prazos máximos de acessibilidade aos seguintes serviços do SNS: intervenção cirúrgica 180 dias; consultas externas hospitalares 90 dias; meios de diagnóstico 15 dias; tratamentos 15 dias (a única forma de acabar com as listas de espera crónicas e injustas).
Incentivar o recurso à telemedicina; desenvolver a competitividade interna (contratualização interna) e externa das organizações; promover a articulação interna interserviços; articulação: cuidados primários/cuidados hospitalares/hospitéis/lares; verbas do piddac/contrato de investimento; definir regras de gestão orçamental e nível máximo de défice; avaliação trimestral do cumprimento do contrato de gestão; introdução de medidas de controlo orçamental: despesas com pessoal/mensalmente; outras despesas/trimestralmente; introdução de incentivos de base institucional/serviço;
Melhorar a normalização estatística e de tabelas de ponderação; divulgar tabela de custos dos actos clínicos principais/hospital; base de dados central/multibanco/Internet/telefone (rede: fixa/móvel): esta central permitiria o conhecimento «on-line» da actividade e da acessibilidade ao SNS a vários níveis; central de inscrição/registo de doentes para atendimento: consultas externas hospitalares; intervenções cirúrgicas; exames especiais; tratamentos; central de registo facturação/empresa/mês; central de registo estatístico/indicadores de rendimento; central de registo de encargos com pessoal; desenvolvimento do benchmarking; acabar com o regime de horários acrescidos; diferenciação salarial dos técnicos de saúde/instituição/serviço/região; implementação do processo clínico virtual; implementação de simulação de factura/doente/episódio; introdução de taxa fixa/dia de internamento hospitalar/até 30 dias; aplicação de formulário terapêutico restrito; implementação dos genéricos e redução do seu preço; prescrição/dose/episódio de doença.
2. Serviço de Urgência
Os serviços que em Portugal designamos como serviços de urgência são sobretudo serviços de atendimento permanente (75%) e urgência/emergência (25%).
Esta realidade traduz a dificuldade de acesso ao médico de família, às consultas externas hospitalares e aos meios de diagnóstico e tratamento. Acontece que o actual modelo de organização e funcionamento destes serviços constitui a válvula de escape dos disfuncionamentos do SNS: é um sorvedor de horas de trabalho médico; é um sorvedor de horas de trabalho de enfermeiros; é um sorvedor de horas de trabalho de técnicos; prejudica o planeamento e a programação cirúrgica; afecta a rentabilidade dos meios complementares de diagnóstico; aumenta excessivamente o consumo de medicamentos; aumenta o recurso a meios de diagnóstico; favorece e estimula a indisciplina do SNS e do sistema de saúde; não resolve o problema da acessibilidade das pessoas/doentes; aumenta o stress dos profissionais e dos utentes.
2.1 Solução?
Horários de prestação dos serviços (de 2.ª a sábado) das 9/19 h:acessibilidade ao médico de família (60 h/semana); acessibilidade às consultas externas hospitalares (60 h/semana); acessibilidade aos meios complementares (60 h/semana); acessibilidade aos tratamentos (60 h/semana); introdução de modelos de triagem; equipa médica/equipa permanente fixa/base semanal/mensal; criação de especialidade médica/intensivista;
É preciso transformá-los em verdadeiros serviços de urgência/emergência, para que cumpram a sua missão e não prejudiquem a actividade hospitalar.
Assim, pensamos que só depois de ser feita uma reestruturação completa do modelo de acessibilidade aos cuidados de saúde primários e hospitalares é possível pôr termo ao estado caótico de alguns serviços chamados de urgência.
Já vários governos o tentaram mas não o conseguiram, porque se esqueceram do enquadramento de visão e análise estratégica e compreensiva do sistema.
3. Cuidados de Saúde Primários
Medicina convencionada/equipas de médicos de família (3/5); acessibilidade/Medicina Familiar (de 2.ª a sábado) das 09.00 h às 19.00 h; assinatura de contratos de gestão com centros de Saúde; prescrição electrónica; centros de Saúde/Educação para a Saúde/Vacinação; apoio ao desenvolvimento de clínicas privadas de Saúde Familiar; introduzir incentivos de desempenho por equipa/centro de Saúde.
4. Cuidados de Saúde Diferenciados
Assinatura de contratos de gestão com os hospitais; equipas de gestão profissional; introdução de incentivos equipa/serviço/hospital; afectação do pessoal médico/novo modelo; SU/novo modelo de afectação de pessoal médico; horários alargados dos serviços: B.O. 8 h/sala/dia útil/activ./prog; meios de diagnóstico 10 h/dia útil/activ/prog; meios de tratamento 10 h/dia útil/activ/prog; consultas externas 10 h/dia útil/activ./prog; prescrição electrónica; centralização hospitalar/grupos hospitalares; hospitais de nível um (mais pequenos) devem ser agregados a centros hospitalares existentes ou a criar; novos hospitais/parcerias/private finance initiative (apenas construção) Obras em Hospitais/Contratos de investimento; horários acrescidos trocados por incentivos equipa; dinamização do teletrabalho administrativo e outros.
5. Gestão de M.C.D.T
Em regime de contrato com equipas de técnicos nos períodos para além da capacidade da carga horária de 35 h/semanal do pessoal, como forma de se cumprir as taxas de rentabilidade dos equipamentos disponíveis, altamente diferenciados e de custos muito elevados, em termos de investimento e encargos de manutenção, o que implica o mínimo de 60 h/actividade/programada/semana.
Em alternativa, imaginamos a cessação de exploração destes meios através de contrato de gestão com a equipa técnica destes serviços ou com empresas externas.
As medidas propostas podem constituir factores e/ou contributos de ajuda a uma melhoria do SNS ao serviço das pessoas.
6. Conclusão
Este é o caminho do futuro, o qual só com grande habilidade de gestão técnica e política pode conduzir de uma forma radical, mas sustentada e coerente à tão desejada reforma do SNS e do Sistema de Saúde Português.
Não podemos ter dúvidas, mudar é difícil, mas não mudar pode ser fatal!
Dr. José Marques
Administrador Hospitalar