Artigo de Medicina e Saúde®
Nº 102 / Abril de 2006
18 Opinião - Dr. Carlos Adriano
HALITOSE E DENTISTAS – mentiras e verdades
Dr. Carlos Adriano
Médico dentista FMDUL, e médico de Clínica Geral FMUL.
Mau hálito, ou halitose, pode originar rejeição amorosa, exclusão social e/ou discriminação profissional sem saber porquê!
Paradoxalmente, a maioria dos portadores de halitose não sabe que a tem, e os halitofóbicos vivem obcecados pelo mau... bafo!
Esta situação é chamada de «paradoxo do mau hálito»!
A incapacidade de autodetectar, ou confessar ter mau hálito, e, por outro lado, não ter mau hálito perceptível e viver obcecado de o ter, a halitofobia é um paradoxo com consequências que, provavelmente, nem imaginou.
Milhões sofrem em silêncio, estimando-se que a halitose afecte mais de 36 milhões de pessoas, que gastam mais de 1350 milhões de euros em tratamentos ou prevenção.
Professores, políticos, advogados, actores, vendedores, recepcionistas, são algumas das profissões com propensão para desencadear halitose!
Falar muito desidrata a boca, impedindo a saliva de remover bactérias presentes na cavidade oral, que produzem compostos com radicais sulfídricos, vulgo enxofre, tal como refere Rosenberg, microbiologista especialista no... mau bafo!
O mau hálito, em 85% dos casos, tem origem na cavidade bucal, mais propriamente na região posterior do dorso da língua, mas é evidente que má higiene oral, patologia periodontal, restaurações imperfeitas, próteses desajustadas, contribuem, tal como a cavitação provocada pela cárie, por acumulação de resíduos!
Ao contrário do vulgarmente dito, maioritariamente, não provém do estômago nem das fossas nasais, e assim, apesar de Grapp, já em 1933, ter referido o papel do dorso da língua na etiologia da halitose, só mais recentemente e por influência de investigação médico-dentária é que se estudou a fundo e surgiram novas terapêuticas e preventivos.
Note-se que a cavidade bucal contacta pela rinofaringe, com as fossas nasais através das choanas e com o ouvido médio através das trompas de Eustáquio. Pela hipofaringe, com o estômago através do esófago, e com o aparelho respiratório através da laringe. Pela sua abertura, como é lógico, contacta com alimentos que, localmente, podem ser responsáveis pelo mau hálito.
Já Shakespeare em Sonho de uma noite de verão referia: «Não coma cebolas ou alho se quer ter um hálito doce»!
O jejum prolongado, mas principalmente a dieta, a ingestão alcoólica, hábitos tabágicos podem estragar um encontro de negócios ou... romântico!
A dieta mediterrânica, todavia, contém azeite e outros óleos
mediterrânicos, que, aparentemente, combatem o «bafo» a alho e cebola.
Também óleos essenciais e anti-sépticos contribuem para abafar... o bafo!
São assim utilizados, em forma de cápsulas, pastilhas, dentífricos, colutórios, sprays, para a prevenção e tratamento desta patologia.
Não confundir com caramelos, chicletes, sprays mentolados ou aromatizantes que dissimulam, mas não tratam!
É lógico que os métodos de higiene, nomeadamente, raspadores linguais, escovas com lixas papilares, vão ao cerne da questão ao limparem o principal foco, o dorso lingual, onde se acumulam as bactérias.
O sexo feminino tem dias... assim, a menstruação, melhor dito, durante o período menstrual, altera-se o hálito, tal como algumas dietas adelgaçantes!
Alguns antidepressivos ao provocarem xerostomia (boca seca), e antiepilépticos pela hiperplasia gengival e consequente gengivite, provocam mau hálito.
As próteses fixas, pela impactação alimentar, e as removíveis, pelo acrílico microporoso, são outra fonte, nomeadamente, as últimas quando se usam à noite. Pode testá-las, colocando-as num saco plástico, aguardar uns minutos e... cheirar!
Mas porquê não cheiramos o nosso próprio hálito?
Gabassi e Zanuttini dizem que a autopercepção depende de experiências e traços de personalidade da pessoa.
O organismo altera o limiar de sensibilidade, das terminações olfactivas, situadas na lâmina crivada do etmóide, tecto das fossas nasais, felizmente, impedindo que, em caso de halitose, o ar expirado seja cheirado!
O olfacto está ligado pelos bulbos olfactivos directamente ao Sistema Límbico Cerebral, responsável pela parte mais ancestral, inconsciente de atracção sexual e da libido, como o despoletado pelas feromonas.
Consequentemente, o mau hálito pode desencadear reacções inconscientes de rejeição e afastamento instintivo, para além das conscientes, como abrir janelas, mexer no nariz, tapar a boca ou mímica de desagrado!
Não sofra mais!
Para resolver o seu problema, existe consulta específica de halitose, que, pela complexidade e diversidade de possíveis causas, envolve conhecimentos de Clínica Geral e Medicina Dentária.
Doenças sistémicas com... bafos!
Diabetes: na descompensação provoca acetoacidose, cheiro a maçãs.
Trimetilaminuria: Felizmente raro, na expiração provoca a síndroma do odor a peixe!
Insuficiência renal: a acumulação de ureia, uremia, origina cheiro a amoníaco!
Cacosmia: algumas neoplasias e patologia psiquiátrica originam falso cheiro ou mesmo cacogeusia, sabor a fezes!
Síndrome de Sjogren: caracterizado por xerostomia, xeroftalmia e ficam com mau hálito.
Patologia psiquiátrica com... maus bafos!
Halitofobia: medo obsessivo de ter mau hálito.
Psicose hipocondríaca monossintomática: ilusão hipocondríaca.
Síndrome de referencia olfactiva: subtipo de ilusão do odor.
Desordem dismórfica corporal: preocupação sobre valorizada.
Depressão: alucinação olfactiva geralmente com defuntos.
Esquizofrenia: Odores alucinantes como a fezes.
Stress pós-traumático: Recordação de cheiros como explosivos
Mentiras e verdades
Mau Hálito maioritariamente provém do estômago:
Mentira, é bucal.
A cárie não provoca mau cheiro:
Verdade é dos detritos acumulados.
Rebuçados melhoram:
Mentira, até multiplicam as bactérias.
Ressonar piora:
Verdade porque agrava a desidratação oral.
Sexo oral sem problema:
Mentira, o cunnilingus propicia candidíase.
Sexo oral anal piora:
Verdade, por colonização oral com bactérias sulfurosas
provenientes do tracto intestinal.